POESIA: EU, ETIQUETA - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE - P

POESIA: EU, ETIQUETA - CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE -
Poesia: Eu, etiqueta
Em minha calça está grudado um nome
Que não é meu de batismo ou de cartório
Um nome... estranho
Meu blusão traz lembrete de bebida
Que jamais pus na boca, nessa vida,
Em minha camiseta, a marca de cigarro
Que não fumo, até hoje não fumei.
Minhas meias falam de produtos
Que nunca experimentei
Mas são comunicados a meus pés.
Meu tênis é proclama colorido
De alguma coisa não provada
Por este provador de longa idade.
Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,
Minha gravata e cinto e escova e pente,
Meu copo, minha xícara,
Minha toalha de banho e sabonete,
Meu isso, meu aquilo.
Desde a cabeça ao bico dos sapatos,
São mensagens,
Letras falantes,
Gritos visuais,
Ordens de uso, abuso, reincidências.
Costume, hábito, premência,
Indispensabilidade,
E fazem de mim homem-anúncio itinerante,
Escravo da matéria anunciada.
Estou, estou na moda.
É duro andar na moda, ainda que a moda
Seja negar minha identidade,
Trocá-lo por mil, açambarcando
Todas as marcas registradas,
Todos os logotipos do mercado.
Com que inocência demito-me de ser
Eu que antes era e me sabia
Tão diverso de outros, tão mim mesmo,
Ser pensante sentinte e solitário
Com outros seres diversos e conscientes
De sua humana, invencível condição.
Agora sou anúncio
Ora vulgar ora bizarro.
Em língua nacional ou em qualquer língua
(Qualquer, principalmente.)
E nisto me comprazo, tiro glória
De minha anulação.
Não sou - vê lá - anúncio contratado.
Eu é que mimosamente pago
Para anunciar, para vender
Em bares festas praias pérgulas piscinas,
E bem à vista exibo esta etiqueta
Global no corpo que desiste
De ser veste e sandália de uma essência
Tão viva, independente,
Que moda ou suborno algum a compromete.
Onde terei jogado fora
Meu gosto e capacidade de escolher,
Minhas idiossincrasias tão pessoais,
Tão minhas que no rosto se espelhavam
E cada gesto, cada olhar,
Cada vinco da roupa
Sou gravado de forma universal,
Saio da estamparia, não de casa,
Da vitrine me tiram, recolocam,
Objeto pulsante mas objeto
Que se oferece como signo de outros
Objetos estáticos, tarifados.
Por me ostentar assim, tão orgulhoso
De ser não eu, mar artigo industrial,
Peço que meu nome retifiquem.
Já não me convém o título de homem.
Meu nome noco é Coisa.
Eu sou a Coisa, coisamente.
Carlos Drummond de Andrade.
Entendendo a poesia:
01 – Quais elementos do poema você observa na vida cotidiana?
.
02 – Qual a ordem de importância no poema entre esses três elementos: pessoa,
mercadoria e marca?
03 – O poema faz uma crítica a sociedade atual. Qual é esta crítica?
04 – O que são "Logotipos do mercado" Faça um levantamento dos logotipos, mais
conhecidos, as empresas que os detêm e os países de origem dessas empresas, ou seja, onde
estão as suas sedes?
06 – Pesquise no dicionário o significado da palavra “EU”.
.
07 – Agora, pesquise o significado da palavra “COISA”.
08 – Qual a diferença entre “EU” e “COISA”?
09 – Você, assim como o autor da poesia, também se sente “coisificado”? Por quê?
10 –Selecione um trecho da poesia que demonstre a perda da identidade para a
propaganda.
11 – Você procura “estar na moda”? Por quê?
12 – Na opinião de Carlos Drummond de Andrade, “estar na moda” significa abrir mão
da identidade. E na sua opinião?
13 – Você se julga “coisa” ou “homem”? Por quê?
14 – Na poesia há algumas palavras inventadas pelo autor. Exemplo: “coisamente”. Que
tal você inventar algumas e coloca-las numa frase?

0 Respostas

Micaelvanzeler Sheila está aguardando sua ajuda.

Sua resposta
Ok

Mais perguntas de Português





















Toda Materia
Toda Materia
Toda Materia

Você tem alguma dúvida?

Faça sua pergunta e receba a resposta de outros estudantes.

Escola Educação